Muitos leitores reagiram ao tema sobre o agir coletivo. Para a maioria, a questão para quem se preocupa com o bem comum é saber como incentivar tal atitude ou como educar filhos ou alunos para que saibam que pertencem a um grupo e deem prioridade a esse lugar. Vamos, pois, pensar a esse respeito.
A família tem mudado muito nas últimas décadas não apenas em sua configuração mas também, e principalmente, em seu estilo de viver. É preciso reconhecer que o individualismo do nosso tempo influencia decisivamente essas mudanças, e nem sempre os pais percebem os efeitos dessa atitude em seu próprio comportamento educativo. O fato é que eles têm contribuído para que os filhos permaneçam cada vez mais centrados em si, já que a família encontra dificuldades para se tratar como grupo: o pronome nós parece ter perdido força.
Outro dia assisti a uma cena em um filme que considerei um belo exemplo. Um garoto de uns sete anos roubara um salame de uma padaria. Quando o pai chegou em casa e foi alertado pela mãe do ocorrido, obrigou o filho a devolver o alimento. Só depois o pai perguntou o motivo de sua atitude e obteve como resposta a preocupação de não ter o que comer. A frase do pai nesse momento é maravilhosa: “Seja qual for a situação, nós não roubamos”. Essa frase guarda grandes lições.
A primeira: a família é um grupo que tem tradições, e todos os seus integrantes devem respeitá-las. É isso que permite que a família continue sendo um grupo de pertencimento. As lições passadas pelos pais aos filhos ensinam que eles têm responsabilidades por serem representantes desse grupo.
A segunda: estamos sempre associados a outras pessoas, seja de modo livre ou não. Por isso, ao tratar qualquer questão, é preciso considerar os que fazem parte desse grupo e não apenas os próprios interesses. No caso da família, tal associação não ocorre livremente: os filhos estão ligados aos pais sem escolha. Mesmo assim, fazem parte desse grupo e devem aprender a honrar essa relação.
Os pais, entretanto, têm colaborado pouco para que os filhos vejam que a família é um grupo. É mais fácil a criança se perceber como centro de uma reunião de pessoas, e é desse modo que fica estagnada na relação egocêntrica com a vida. Na escola também tem sido difícil oferecer oportunidades para que possa florescer a relação dos mais novos com o coletivo e com a criação do bem comum. Afinal, nesse ambiente o aluno poderia aprender a integrar os outros em sua vida e a se ver como membro de um coletivo.
Não podemos deixar de reconhecer que há intenção nesse sentido: os trabalhos em grupo, por exemplo, são cada vez mais frequentes. Mas os alunos precisam aprender a agir como integrantes de grupo na realização das tarefas, e isso pode significar se contrariar pelo bem do grupo, o que não é fácil.
Na juventude, eles buscam se agregar com mais solidez a grupos, mas como estão só com pares, acabam como cegos conduzidos por cegos na difícil aprendizagem de escapar do domínio dos outros sem deixar de estar associado a eles.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de “Como Educar Meu Filho?” (ed. Publifolha)
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