REFLEXÕES

Sobre a responsabilidade

Não há lugar para a criança nem para o velho neste mundo.

A juventude é muito mais do que um período – curto, por sinal – da vida. É um valor sociocultural, uma obrigatoriedade, um estilo de vida assumido por quase todos. Crianças mimetizam o jovem tanto na aparência quanto no modo de falar e de se comportar e até nas atitudes diante da vida e dos adultos, que as tratam como pequenos adultos.

Esse fato tem provocado os mais variados problemas para as crianças, principalmente para as que vivem a chamada primeira infância (os seis primeiros anos). E tem gerado problemas também aos pais, em suas tarefas educativas. Para falar a verdade, as aspirações educativas dos adultos têm sido pouco realistas, e esse fato gera conturbadas situações no relacionamento entre pais e filhos.

Há regras e exigências em demasia sendo jogadas sobre essas pequenas crianças. Como não respondem adequadamente, elas são abandonadas e sucumbem a seus impulsos. É então que surgem essas crianças com as quais é difícil conviver: birrentas, mandonas, choronas, desrespeitosas, barulhentas, teimosas, inquietas etc.

Vamos analisar alguns exemplos. Não é incomum que os pais tentem passar aos filhos pequenos algumas tarefas, próprias do mundo deles, para que aprendam a ser responsáveis. Assim, muitas crianças recebem a incumbência, por exemplo, de guardar seus brinquedos após usá-los.

O que não é levado em consideração nessa hora é que a criança ainda não consegue assumir responsabilidades sozinhas, mesmo as mais simples.

Esse é um dos motivos que a fazem reagir, negar, desobedecer. O que se pede a ela é mais do que ela pode assumir. Ela pode, sim, aprender o princípio da responsabilidade se for solicitada sempre a ajudar os pais quando eles arrumam a bagunça. Ou seja: os pais se responsabilizam e realizam as tarefas, e os filhos os ajudam.

Outra situação que costuma provocar embates é a hora das refeições. Muitos pais têm o anseio legítimo de que os filhos os acompanhem nas poucas refeições que fazem juntos. Nada mais interessante do que esse momento para a família se reunir e colocar a conversa em dia. Mas é demais exigir isso de uma criança. Ela come porque tem fome, apenas isso. Não consegue ficar sentada e partilhar momentos sociais. Depois de comer, ela quer brincar, e aceitar esse fato é mais realista.

Assim é com todas as atividades cotidianas: tomar banho, escovar os dentes, trocar de roupa, entrar no carro. Esperar que o filho aprenda a fazer tudo isso por conta própria, ou seja, que obedeça ao simples comando verbal dos pais, é exigir demais. São os adultos que devem se responsabilizar e levar o filho a fazer. Com condução física, inclusive.

E os castigos? Castigar uma criança pequena na expectativa de que esse seja um instrumento educativo é irreal! Se a criança faz birra, ela não deve ser castigada, e sim desfocada do motivo que a levou a se comportar assim. E, de preferência, de maneira lúdica. Essa é a linguagem que ela entende, e é isso que funciona. Se a criança não faz o que deveria ou faz o que não deveria, deve ser conduzida ou impedida, e não castigada. Vamos reservar os castigos para as crianças maiores, que já podem aprender com isso.

Para ensinar a criança pequena, os adultos devem fazer o que querem que ela aprenda e solicitar sua colaboração. Com as maiores de seis anos, os pais podem exigir mais, porque elas são capazes de assumir pequenas responsabilidades: elas devem fazer, e os pais devem apenas ajudar. Não parece que muitos têm invertido essa equação?

ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de “Como Educar Meu Filho?” (ed. Publifolha)
roselysayao@folhasp.com.br
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